segunda-feira, 22 de março de 2010

Você pode me mostrar Deus?

por Sri Srimad Bhaktivedanta Narayana Gosvami Maharaja


Certo rei da Índia antiga acalentava o desejo de ver Deus. Com isto em mente, mandou chamar seu primeiro-ministro e perguntou-lhe: Você pode me mostrar Deus? Pode me dizer o que Deus está fazendo agora?

O ministro não encontrou de imediato a resposta apropriada para aquela pergunta. Por isso, pediu três dias ao rei, que, mesmo assentindo, advertiu-o de que perderia sua confiança nele se sua resposta fosse insatisfatória.

Em casa, o ministro pesquisou em todos os livros de sua biblioteca, mas, após dois dias de
intensa pesquisa, nada.

O ministro tinha um filho de cinco anos que, vendo-o tão ansioso, perguntou-lhe:
– Papai, que há de errado com você?
– Não encontro resposta para uma pergunta do rei e posso perder meu cargo por isso.
– Qual é a pergunta do rei? – quis saber o menino.
– É uma pergunta muito complicada para você entender, meu filho. Não preocupe sua cabecinha com esse tipo de coisa.

O menino, porém, insistiu tanto com o pai que este acabou lhe revelando a pergunta do rei. Sorrindo com doçura, o menino disse ao pai: Papai, é muito simples. Quando for à corte amanhã, diga ao rei que esta resposta é tão fácil que até o seu filhinho de cinco anos a sabe.

O ministro, já em estado de desespero, não viu alternativa senão depositar sua fé e esperança no filho. Na manhã seguinte, o rei recebeu o ministro e de novo perguntou-lhe: Meu caro ministro, você pode me mostrar Deus e me dizer o que Ele está fazendo?

Humilde, o ministro respondeu: Ó rei, esta pergunta é tão simples que até o meu filhinho pode respondê-la.

Apesar de surpreso, o rei voltou-se para o menino e disse: Ótimo. Muito bem, meu caro menino, você pode me mostrar Deus e me dizer o que Ele está fazendo?
O menino disse: Caro rei, por favor, traga-me uma panela cheia de leite. Ainda que um tanto desconcertado com o pedido, o rei assentiu.
– Meu caro rei, há alguma manteiga neste leite?
O rei refletiu por um instante. – Sim, é claro, há manteiga no leite.
– O senhor pode mostrá-la para mim?
– Sim – replicou o rei – mas primeiro, para podermos ver a manteiga, temos que bater o leite.
– Exatamente – retrucou o menino. – De modo semelhante, há um processo mediante o qual podemos ver Deus. Se seguirmos este processo divino, Deus com certeza Se manifestará perante nós. Sem este processo de dedicada prática espiritual, Deus fica escondido de nossa percepção direta, da mesma forma que a manteiga fica escondida no leite até que se faça a batedura do mesmo.

Ao ouvir esta explicação maravilhosamente lógica em resposta à sua primeira pergunta, o rei deu-se por satisfeito. Em seguida, fez a segunda pergunta ao filho do ministro: Agora, você pode me dizer o que Deus está fazendo?
– Bem – disse o menino – o senhor está indagando de mim tal qual um discípulo indaga do guru, só que está sentado num trono elevado, ao passo que eu estou sentado no chão diante do senhor. Segundo dita a etiqueta, o senhor deveria estar sentado na posição humilde e eu, no assento elevado.

Vendo a verdade nas palavras do menino, o rei ergueu-se de seu assento e sentou-se no chão. O menino ascendeu ao trono.
– É isto que Deus está fazendo – disse o menino. Às vezes, Ele nos coloca em posição elevada e outras, em posição inferior, conforme os resultados de nossas atividades anteriores. Às vezes, assumimos um nascimento aparentemente elevado e outra, um inferior. Deus providencia essas mudanças e concede resultados diferentes segundo nosso karma.

O rei, de tão satisfeito com as respostas do menino, proclamou aquelas verdades em todo o seu reino. Recompensou com muitos presentes valiosos o ministro e seu filhinho brilhante!
A simples história acima ilustra a verdade sobre o processo ao qual devemos nos dedicar para atingirmos a perfeição espiritual. Este processo chama-se bhakti-yoga, ou o caminho do amor divino. Confira os dois outros artigos desta publicação para entender ainda melhor este assunto. 

sábado, 21 de novembro de 2009

Como alcançaremos Krsna-prema?

Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura









Pergunta1: Como alcançaremos Krsna-prema?

Resposta: Os devotos de Bhagavan sustentam uma esperança promissora de que as entidades vivas alcançarão seu bem estar eterno e de que estas não permanecerão ocupadas com assuntos inauspiciosos. Os únicos meios para se alcançar este bem-estar eterno é abrigar-se aos pés de lótus de śrī gurudeva, que é muito querido pelo Senhor Kṛṣṇa (kṛṣṇa-preṣṭha). Por abrigar-se aos pés de lótus de śrī gurudeva, que é não-diferente de Śrī Rūpa, a pessoa alcançará a posição de um servo de Nanda-nandana Śrī Kṛṣṇa. Este śrī gurudeva deve ser servido com amor e convicção determinada e deve-se ouvir sobre hari-bhajana de seus lábios de lótus.

Quando a poeira dos pés de lótus de Śrīla Gurudeva se tornar nosso suporte principal, seremos capazes de alcançar madhurya-seva a Śrī Kṛṣṇa, Ele que encanta o mundo inteiro (bhuvana-mohana). Então devemos sempre adorar os pés de lótus de Śrīla Gurudeva sem interrupção.

Śrīla Gurudeva é transcendental (aprākṛta). Ele não é uma entidade temporária deste mundo, meramente um corpo de carne e sangue. Sua forma, assim como a de Śrī Bhagavān, é composta de eternidade, conhecimento e bem-aventurança. Śrīla Gurudeva é nara-brahma – um ser humano transcendental – ele não é nara, um homem comum e mortal. Qualquer serviço oferecido a seres transcendentais como guru e Gaurāṅga por aqueles que os consideram como parte da multidão deste mundo, é simplesmente pretensioso, uma vez que tais pessoas somente fazem serviço para satisfazer seus próprios interesses egoístas. Tal serviço não é serviço puro e, ao invés disso, simplesmente reflete a mentalidade de um negociante, padmā-nīti*.

Enquanto a alma não estiver completamente sob a guia daquele ser mais adorável, śrī gurudeva, Bhagavān não se tornará o objeto de sua visão (darśana). Aqueles que não estão conscientes das qualidades de śrī gurudeva, tais como sua transcendência (aprākṛtatva), sua posição como mestre (īśvaratva) e sua intimidade excepcional com Kṛṣṇa (kṛṣṇa-preṣṭhatva), são totalmente desqualificados para entrar na morada transcendental de kṛṣṇa-sevā. Somente pela misericórdia de śrī gurudeva poderemos nos aproximar da Entidade Transcendental.

Em outras palavras, por se abrigar aos pés de lótus de Śrī Caitanyadeva seremos capazes de receber Seu darsana com olhos divinos, os quais serão compostos de consciência pura e repletos da bela tendência a servir. Deste modo, por ter a boa sorte de se aproximar dos pés de lótus de svayaṁ-rūpa Śrī Kṛṣṇa, nos tornaremos abençoados e alcançaremos nosso propósito.

Enquanto permanecermos cativados pelas aparências externas e mundanas (prakṛta-rūpa), não receberemos o darśana de śrī gurudeva, que é não-diferente de Śrī Rūpa (Śrī Rūpa Gosvāmī ou, literalmente, "aquela beleza graciosa"). Somente quando realizarmos serviço amoroso sincera e honestamente (bhajana) para aquelas entidades adoráveis, śrī guru e Śrī Kṛṣṇa, alcançaremos auspícios e, então, nossa visão atual, pela qual percebemos todos os objetos como objetos para nosso desfrute, finalmente cessará. Portanto, minha prece é:

adadānastrinaṁ dantair
idaṁ yāce punaḥ punaḥ
śrīmad guru padāmbhoja
dhuliḥ śyāṁ janma-janmani

Tendo colocado uma folha de grama entre meus dentes, reclino-me e oro repetidas vezes: “Não desejo nenhuma das quatro metas da vida humana, a saber: dharma (religiosidade), artha (desenvolvimento econômico), kāma (gratificação dos sentidos) ou mokṣa (liberação). Somente quero me tornar uma partícula de poeira aos pés de lótus de Śrīla Gurudeva. Isto é, sob a orientação de meu Śrīla Gurudeva, desejo servir Bhagavān constantemente da mesma forma que meu gurudeva O serve.”

“Kṛṣṇa é meu. Se eu não O servir, Ele experimentará um grande problema.”

Somente alcançaremos kṛṣṇa-prema, ou serviço a Śrī Kṛṣṇa, quando este tipo de sentimento amadurecer completamente. Tal boa fortuna só é possível quando a pessoa ganha a afeição de śrī gurudeva por prestar serviço a ele.

Pergunta 2: A fé (śraddhā) em śrī gurudeva é verdadeiramente a raiz de bhakti?

Resposta: Certamente. É absolutamente essencial ter sambandha-jñāna (conhecimento dos relacionamentos existenciais) antes de bhakti despertar. Śrī gurudeva é o único que concede este sambandha-jñāna. Uma fé resoluta em śrī guru, que é completamente transcendental, é a raiz de bhakti.

Adau śraddhā. O primeiro estágio é a obtenção de fé transcendental. Após abrir mão da certeza cega de que existem numerosas religiões diferentes e abandonar o caminho da lógica e da argumentação, nosso primeiro e mais importante requisito é desenvolver śraddhā nas instruções auspiciosas de śrī gurudeva.

O que significa śraddhā? Śraddhā significa ter total confiança nas palavras de śrī gurudeva. Significa que nunca devemos confiar nas palavras de qualquer pessoa mundana pois todos são farsantes, a exceção de śrī gurudeva. Renunciando às palavras de todas as outras pessoas neste mundo, devemos estabelecer as palavras de śrī gurudeva como o objeto de toda nossa fé, uma vez que ele descende de Vaikuṇṭha exclusivamente para nos salvar. Se não fizermos isso então não haverá espaço para nossa felicidade. Somente pela misericórdia de śrī gurudeva que nossos anarthas (obstáculos) serão dissipados e todas nossas esperanças serão realizadas. Pela misericórdia dele somente nos será concedido o darśana de Bhagavān e obteremos a Sua misericórdia.

Por estar nas proximidades do sādhu e do guru e por se associar com eles, seremos aliviados de todas as nossas dificuldades e, assim, obteremos śuddha-bhakti. Então devemos contar com śrī gurudeva irrestritamente para nos aproximarmos e servimos a Pessoa Absoluta. Śrī guru nos dará o benefício mais elevado. Se, por acaso, encontrarmos um guru verdadeiro, então certamente seremos salvos e alcançaremos nossa meta. Śrī guru sempre nos suprirá enriquecendo-nos com o conhecimento e o serviço transcendentais.

Pensar em regular gurudeva de algum modo é uma visão de mundo de um ateísta.É esta concepção exclusivamente que constitui a desobediência ao mestre espiritual (guru-avajña – a terceira das dez ofensas aos santos nomes) e deve ser sempre abandonada.

Pela misericórdia de śrī gurudeva, nós, partículas atômicas de consciência (aṇu-caitanya), nos aproximaremos da Consciência Suprema e Infinita (vibhu-caitanya). Iremos abandonar a associação das outras pessoas comuns e nos aproximaremos de nosso Senhor eterno. Embora śrī gurudeva se considere um servo insignificante de Bhagavān, eu o considero como meu amigo eterno e bem-querente, o único que pode me ajudar a me aproximar de Bhagavān. Considero śrī gurudeva como sendo tanto idêntico a Bhagavān como o querido de Bhagavān. Irei me render completamente aos seus pés de lótus. Sem nenhum interesse pessoal, irei unir todos os meus esforços somente para serví-lo. Só então alcançarei toda a perfeição.

Pergunta 3: Como podemos obter a felicidade?

Resposta: A pessoa pode se livrar do medo e da tristeza e experimentar a felicidade verdadeira por permanecer abrigada aos pés de lótus de Śrīla Gurudeva podemos obter a sua associação por serví-lo. É possível receber a misericórdia de Śrīla Gurudeva muito rapidamente por permanecer ocupado no serviço a ele o tempo todo, através do corpo, mente e palavras. Quando Śrīla Gurudeva está satisfeito, a inclinação a serví-lo aumenta cada vez mais. Esta sorte é a melhor de todas as boas fortunas e a única recompensa verdadeira.

Pergunta 4: O que é bhakti?

Resposta: A busca por dar felicidade e satisfação a Deus (Bhagavan) constitui bhakti. O sentido e o significado de bhakti é promover a felicidade e a satisfação de Kṛṣṇa e não a de cada um de nós. Bhakti é a ocupação inata da alma e também a única função eterna, natural e constitucional (dharma) dos seres vivos. Por constituição a alma não tem outra função (dharma).

Qualquer outra tendência não é o dharma verdadeiro da alma, uma vez que nenhuma outra tendência é a função constitucional da alma assim como bhakti é. Pelo contrário, estas outras tendências são reflexos distorcidos do dharma verdadeiro e são, portanto, temporários e provisórios.

Bhakti destrói o medo, o sofrimento e a ilusão. O que causa o medo, o sofrimento, a ilusão e assim por diante é nada mais senão a absorção naquilo que percebemos como separado de Kṛṣṇa. Tudo que é percebido como separado de Kṛṣṇa ou de Seus devotos constitui dvitīya-abhiniveśa (absorção em assuntos secundários e insignificantes). Bhakti compreende uma absorção completa e exclusiva em uma única entidade: Bhagavān Śrī Kṛṣṇa, e é repleta de estabilidade (niṣṭhā) Nele.

Pergunta 5: Bhagavān alguma vez interfere na independência da entidade viva?

Resposta: A entidade viva é um fragmento minúsculo (aṇu-aṁśa) de Parameśvara, a Supreme Infinite Consciousness (vibhu-caitanya).

Uma gota de água tem as mesmas qualidades de um oceano de água, embora em uma quantidade diminuta. Similarmente, uma vez que vibhu-caitanya Bhagavān é supremamente independente, a alma infinitesimal também tem a qualidade da indenpendência, mas somente num grau infinitesimal.

A entidade viva não é criada, ela é uma entidade eterna. A alma também não é inerte, ao invés disso ela é consciente. A independência que a entidade viva possui não foi concedida por ninguém, pois é inata à sua existência. A alma somente experimenta o sofrimento devido ao mal uso de sua indenpendência.

Bhagavān nunca interfere na indenpendência de ninguém, pois Ele não é o destruidor de cetana-dharma, o estado de jurisdição natural e inata da alma. Bhagavān é um oceano de compaixão e, assim, Ele simplesmente familiariza o ser vivo com o uso apropriado e desapropriado de sua faculdade da jurisdição. Somente aqueles que se ocupam em bhajana de Bhagavān após ouvir todas estas instruções Dele ou das escrituras – em outras palavras, aqueles que exercitam sua independência apropriadamente - podem obter seu bem-estar supremo.

Pergunta 6: O que é māyā (ignorância)?

Resposta:Mīyate anayā iti māyā – aquilo que pode ser usado para medir ou aquilo que pode ser medido é māyā.” A combinação de (não) e (aquilo) produz a palavra māyā, ou, literalmente, “aquilo que não é”.

Māya abrange tudo aquilo que é perecível e temporário. Aquilo que não é o Senhor Supremo, Bhagavān, é māyā. Bhagavān é o mestre de māyā; Ele não pode ser medido.

Māyā, conforme descrito no Śrīmad-Bhāgavatam, não é uma entidade separada, como parece no Cristianismo, onde Deus e o Diabo são considerados duas entidades separadasDe acordo com a escola de Bhāgavata, māyā reside atrás da Suprema Personalidade, Bhagavān, ainda que como Sua sombra, num estado de condenação para castigar e corrigir as entidades vivas que se tornaram avesas a Kṛṣṇa.

* Padmā-nitī – a política de Padmavātī, mãe de Kaṁsa, que audaciosamente queria ajustar o débito dos Yādava a ser pago aos Vrajavāsīs através do cálculo do pagamento em trocade todas os serviços amorosos transcendentais que eles prestaram para Kṛṣṇa enquanto Ele morou com eles.

Traduzido para o inglês do Śrīla Prabhupadera Upadeśāmṛta e publicado pelo Rays of The Harmonist team. As perguntas foram renumeradas para esta apresentação on-line.

Traduzido para o português por Basanti dasi do Rays of The Harmonist, ano 2, número 7, 11 de agosto de 2009.

http://www.purebhakti.com/resources/harmonist-monthly/51-year-2/1071-how-will-we-attain-krsna-prema-.html


domingo, 2 de março de 2008

Mensagem para os devotos

por Srila Bhaktivedanta Narayana Gosvami Maharaja



“Eu quero que todos os devotos brasileiros sejam felizes. Tentem seguir de forma estrita a mensagem de Srila Rupa Gosvami e Raghunatha dasa Gosvami, conforme eu tenho ensinado em minhas aulas − o processo para praticar bhajana como as gopis serviram a Krsna, com amor e afeição.

Nosso guru-varga afirma:
aradhyo bhagavan vrajesa-tanayas tad-dharma vrndavanam ramya kacid upasana vraja-vadhu-vargena ya kalpita srimad-bhagavatam pramanam amalam prema pum-artho mahan sri-caitanya-mahaprabhor matam idam tatradaro nah parah
Caitanya-manjusa, Srila Visvanatha Cakravarti Thakura

O que Sri Caitanya Mahaprabhu falou nós vamos seguir, esta é a meta, o objetivo e a essência do Srimad-bhagavatam. Krsna é o Senhor Supremo, embora Ele esteja roubando manteiga nas casas das gopis. Embora Ele seja um menininho pastoreando as vacas, ainda assim, Ele é o Senhor dos Senhores. Ele é aradhyo [adorável], e Vrndavana-dhama também é digna de adoração como Krsna o é, não há diferença. E o processo pelo qual as gopis serviram a Krsna, com os sentimentos mais elevados, nós devemos seguir da mesma maneira. O Srimad-bhagavatam é pramana, a verdade final, então devemos seguí-lo e, assim, seremos felizes para sempre.

Não sejam fracos e não abandonem esta idéia. Sempre cantem o [santo] nome e preguem a minha missão. Esta é a minha essência de todos os ensinamentos”.

[Tradução de uma declaração de Srila Gurudeva gravada em Sri Govardhana-dhama, India, durante o Sri Vraja-mandala Parikrama no ano de 2003]

Orar humildemente por ajuda

por Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura Prabhupada

Bahubhirmilitva yat kirtanam tadaiva sankirtanam – sankirtana significa o canto congregacional.”



As glorificações e preces estão incluídas no sankirtana. De uma perspectiva externa, aquele que oferece stuti (orações védicas) tem uma posição menos elevada do que o objeto de suas preces. Uma terceira pessoa, entretanto, pode compreender melhor as glórias de uma pessoa por ouvir suas preces. Sri Gaurasundara explicou que para chamar por Bhagavan genuinamente, a pessoa deve ser mais humilde do que uma folha de grama (trnad api sunicena). Não podemos clamar e chorar por alguém até que tenhamos aceitado nossa própria insignificância em relação a esta pessoa. Nós imploramos por ajuda quando somos forçados a tomar consciência de nosso desamparo. Sempre que nos encontramos incapazes de completar uma tarefa por nós mesmos, não nos resta opção a não ser buscar ajuda de alguém. Sozinho não posso desempenhar uma tarefa que requer cinco pessoas para ser realizada.

Sri Gaurasundara nos instrui a clamar por Bhagavan de forma genuína, o que significa que Ele nos persuade a solicitarmos a ajuda de Sri Bhagavan. Isto nós ouvimos de Srila Gurudeva. Contudo, se eu chamo Bhagavan com a intenção de envolvê-lO em algum serviço para mim, ou se peço a Ele com o propósito de fazer alguma tarefa, falta em meu choro a humildade verdadeira de trnad api sunicena. A verdadeira humildade nunca é encontrada numa exibição externa de humildade, a qual é, de fato, mera duplicidade. Clamar por Bhagavan com o sentimento de ser o mestre ou o senhor dEle, esperando que Ele obedeça como um servo não é eficiente. Ele não ouve tal chamado porque Ele é supremamente independente e totalmente consciente. Assim, Ele não é controlado por ninguém. Até que o egoísmo da pessoa estabeleça raízes em uma humildade sincera e sem duplicidade, suas preces não alcançarão Bhagavan, que é completamente independente.

Uma pessoa que é mais humilde que uma folha de grama pode clamar por Bhagavan, mas, ao menos que seja dotada com as qualidades da paciência e tolerância, seu chamado ainda assim não resultará em frutos. Se demonstrarmos impaciência por perseguir nossos próprios interesses, nosso comportamento está em oposição direta ao humor de trnad api sunicena. Se tivermos plena confiança de que Bhagavan é o Ser Completo e de que nosso chamado por Ele nunca resultará em escassez, não experimentaremos nenhuma falta de paciência. Mas se nos tornamos cobiçosos, intolerantes e irrequietos, e se permanecermos inflexíveis de que completaremos nossa tarefa com a força da nossa própria habilidade e competência, não seremos capazes de clamar por Bhagavan no verdadeiro sentido.

Se formos vaidosos, não poderemos clamar por Ele apropriadamente. Além disso, se tentarmos aniquilar nossos verdadeiros interesses próprios, então não seremos capazes de clamar por Bhagavan. Frequentemente pensar que está controlando Bhagavan através de suas preces e então se ocupar em outras atividades nas quais não necessita pedir a ajuda dELe – este tipo de mentalidade também indica a ausência de tolerância.

Deste modo, precisamos de um guardião para nos salvar de tais tendências até que nos tornemos qualificados para orar com sinceridade no humor de trnad api sunicena. Seu abrigo e ajuda são necessárias para nos proteger das inclinações desfavoráveis. Srila Narottama dasa Thakura diz: “asraya laiya bhaje, tanre krsna nahi tyaje, ara sabe mare akarana – aquele que realiza bhajana abrigando-se em personalidades que são como a morada do amor por Krsna, tal pessoa não é negligenciada por Krsna; todos os demais vivem em vão.”

[Trecho do artigo Guru-tattva e seva da revista The Harmonist, nº 15, Kartika, 2005]

Amor

por Srila Bhaktivinoda Thakura

Amor* é uma palavra muito doce. Quando ela é falada, um sentimento doce surge nos corações tanto de quem fala como daqueles que escutam. Embora poucos sejam capazes de compreender seu verdadeiro significado, todos ainda assim gostam de ouvir a palavra. Todos os seres são controlados pelo amor. Muitos até abandonam suas vidas por causa dele. Todos os seres são controlados pelo amor e amar é o único propósito da vida humana. Muitos pensam que a satisfação de seus desejos egoístas é o propósito principal de suas existências, mas isto está errado. Por amor o homem pode sacrificar todos seus interesses próprios. O egoísmo faz com que o homem lute somente pela sua própria felicidade e autonomia, mas o amor faz com que ele sacrifique todos seus interesses pelo bem da coisa ou da pessoa que lhe é querida. Quando quer que haja um confronto entre o egoísmo e o amor, o amor será vitorioso. Em especial, mesmo quando o egoísmo é muito intenso, ainda assim, ele permanece subordinado ao amor. O que é o egoísmo? O egoísmo é esforçar-se por aquilo que é querido para si mesmo. Assim, não deixa de ser razoável afirmar que a vida humana é direcionada pelo amor.

O amor se torna o propósito principal da vida humana, mesmo quando a pessoa luta para satisfazer seus desejos egoístas. Os materialistas e aqueles que buscam a liberação se esforçam na procura de desfrute e liberação, devido ao seu amor por isto. O amor é proeminente no caminho do transcendentalismo também. Aqueles que buscam o prazer espiritual, considerando o prazer mundano como temporário, são de dois tipos: aqueles tomados por uma necessidade de desfrutar e aqueles guiados por um desejo de serem liberados. Os primeiros estão,
atualmente, ou preocupados com a busca por riqueza, reino, esposa e filhos, ou embaraçados pelo desejo de ter a posição de Indra (ou de qualquer outro semideus em Svarga) ou ainda desejando a felicidade nos planetas celestiais como Brahmaloka. Porque eles têm amor por estas coisas, eles constantemente se esforçam para obtê-las.

Aqueles que desejam a liberação não têm amor pelos desfrutes mundanos, mas, pelo contrário, acalentam o desejo de se liberarem das coisas mundanas. Então, por terem amor pela liberação, eles se esforçam por isto. O amor é o que os materialistas buscam com seu desfrute bem como o que os que desejam a liberação procuram nesta. Assim, alcançar o amor é o objetivo final para esses dois tipos de pessoas. O amor é o único objetivo de todo o esforço espiritual.

(...) O significado das afirmações altamente autorizadas dos Vedas é que não existe amor nos planos grosseiro e sutil. Qualquer semelhança de amor que seja encontrada aqui é experimentada somente em relação à alma. A alma pura é transcendental, e o amor que existe entre as almas é amor puro. Somente este amor é digno de ser buscado. O amor mundano, ou o amor que existe entre seres humanos, é não mais que uma distorção do amor da alma. O amor que existe entre as almas é o único amor verdadeiro.

‘Ame a Krsna’ – a instrução mais elevada

No Srimad-Bhagavatam (10.14.55) é dito:
krsnam enam avehi tvam|atmanam akhilatmanam
Sri Krsna, que possui sessenta e quatro atributos excelentes, é a alma de todas as almas. O amor que todas as almas têm por Krsna é livre de designações mundanas e é superlativo. Aqueles que escreveram sobre psicologia e a complexidade do amor, sem conhecer a verdadeira natureza do amor, simplesmente desperdiçaram seu tempo, a despeito de todo o seu raciocínio, como se misturassem ghi (manteiga clarificada) com cinzas. Por causa de orgulho, tais pessoas simplesmente se esforçaram pela fama. Ao invés de terem beneficiado o mundo, elas trouxeram um grande infortúnio. Irmãos! parem de ouvir as falas grandiloqüentes dessas pessoas e desenvolvam apego puro pela alma, fazendo, com isso, que a natureza de sua alma brilhe ao experimentar aquele amor que é livre de todas as designações”.

* A palavra utilizada no original é priti, traduzida como “amor”.

[Trecho traduzido para o Português do texto Love de Srila Bhaktivinoda Thakura publicado na revista Rays of the harmonist 7.1, winter – 2003, p. 8-15]

O processo de inquirir

por Sri Srimad Gour Govinda Maharaja

Como pode uma alma condicionada capturada por maya compreender sua verdadeira identidade? Como ela pode obter esta consciência original, o começo da pureza, a auto-identificação como um servo do Senhor? Ela não pode compreender isto a não ser que Krsna a ensine. Porque Krsna é nosso único amigo e bem-querente, Ele fala o sastra somente para nos ensinar. Mas baseado em nosso próprio mérito, inteligência ou conhecimento mundano, não podemos compreender o sastra. É uma questão de tattva-vicara. Existem dois tipos de considerações, dois tipos de compreensão do sastra: apara-vicara e tattva-vicara, consideração aparente e consideração absoluta. Nossa filosofia vaisnava está baseada somente na consideração absoluta, tattva-vicara. Apara-vicara é condenado. Assim, um guru, um tattva-acarya é necessário.

tad viddhi pranipatena pariprasnena sevaya upadeksyanti te jñanam jñaninas tattva-darsinah

No Bhagavad-gita é dito que devemos aceitar um tattva-acarya, um tattva-darsinah, aquela pessoa que viu a verdade e conhece a verdade. Tal tattva-acarya pode nos dá tattva-jñana. De outra forma não há como obtermos este conhecimento. Embora o sastra esteja lá, somente por lê-lo não é possível entendê-lo. Krsna ensina através do sastra, do guru e do sadhu. A pessoa deve ser submissa e se aproximar de um vaisnava:

tad-vijñanartham sa gurum evabhigacchet samit-panih srotiyam brahma-nistham

Para aprender a ciência transcendental, a pessoa deve se aproximar de um mestre espiritual fidedigno, numa linha de sucessão discipular, e que esteja fixo na verdade absoluta.
Se você for muito sério e estiver ansioso por conhecer este tattva-jñana, você deve se aproximar de uma pessoa apropriada. Tal pessoa é um tattva-acarya. Ele conhece tattva. Ele recebeu este tattva-jñana de seu acarya escutando com submissão. Ele vem numa linha de sucessão guru-discípulo autorizada. Você deve se aproximar de tal pessoa. Então, pranipatena pariprasnena sevaya, renda-se completamente aos pés de lótus dele. Sirva-o, satisfaça-o e humildemente lhe faça perguntas sobre tattva. Então, pela misericórdia deste guru, acarya, ele irá colocar todo o conhecimento dentro de você. Este é o começo da pureza da consciência na busca do desejo do Senhor.

Quando você está muito ávido – “Como posso conhecer este tattva-jñana?” – então você deve se associar com um sadhu – adau sraddha tatah sadhu-sangah. Você deve ouvir com submissão o que o sadhu tem a dizer. Colocando fé firme nas palavras do sadhu, você deve se render. A não ser que você se renda, você não pode colocar fé completa nas palavras do sadhu. Não! Mesmo que você vá até ele, se sente e ouça, ainda assim você não pode conseguir a sua misericórdia. Você não tem fé nas palavras dele porque você não se rendeu.

Por ouvir de um sadhu apropriado você pode entender qual a sua verdadeira identificação: “Oh, ami krsna-dasa, sou um servo de Krsna”. Aqui é dito que a auto-identificação como um servo do Senhor é o começo da pureza da consciência.

[Trecho traduzido do livro Pariprasna – The process of Inquiry de Sri Srimad Gour Govinda Swami Maharaja.]